O prestigiado Hay Festival, conhecido por celebrar a literatura, as ideias e a inovação, ganha um novo protagonista em 2025: uma versão da voz de Stephen Fry criada por inteligência artificial. A instalação interativa intitulada Vocalize promete envolver o público em uma reflexão profunda sobre autenticidade, identidade e o futuro da voz humana na era digital.

A instalação: quando a IA encontra a arte da fala
Vocalize é uma experiência sensorial e participativa onde visitantes são guiados por uma versão sintética da icônica voz de Fry. A atividade simula uma sessão de treinamento de locução, conduzida pela dublê vocal gerada por IA, e termina com cada participante criando o seu próprio rolo de voz personalizado.
Mais do que uma performance tecnológica, a proposta é provocar um diálogo: O que significa ouvir alguém que não está lá? E se essa voz for a sua?
Stephen Fry e a voz como identidade
Fry, famoso por sua voz marcante e eloquência, já havia manifestado publicamente sua preocupação com o uso não autorizado de sua voz em conteúdos gerados por IA. Mesmo assim, ele apoia o projeto Vocalize, justamente por seu caráter crítico e reflexivo.
Segundo o ator, a instalação oferece um espaço seguro para explorar os potenciais criativos e os riscos éticos da clonagem vocal, como a manipulação de discurso, a perda de controle sobre a própria imagem e o impacto emocional da imitação artificial.
IA e clonagem vocal: como funciona?
A clonagem de voz com IA utiliza técnicas de aprendizado profundo, especialmente modelos de síntese de fala neural como Tacotron 2 ou modelos generativos adversariais (GANs). Esses sistemas podem:
- Reproduzir timbres específicos com realismo impressionante
- Modular emoções e estilos de fala
- Gerar fala a partir de texto com quase nenhuma distinção do original
Essas capacidades estão sendo utilizadas em audiolivros, assistentes virtuais, videogames e publicidade, mas também levantam sérias questões legais e morais.
Aplicações e dilemas na indústria da voz
A IA vocal já está transformando:
- Narrativas em audiolivros, com vozes licenciadas
- Dublagens automatizadas em múltiplos idiomas
- Preservação de vozes de artistas falecidos
- Assistência personalizada para pessoas com deficiência vocal
No entanto, também permite a criação de deepfakes sonoros, que podem ser usados em fraudes, manipulações políticas ou desinformação — desafios que já chegaram às cortes e aos parlamentos.
Arte como lente crítica da tecnologia
Ao colocar a voz de Fry — ou uma simulação dela — no centro da instalação, o Hay Festival destaca a arte como um território fértil para discutir os limites da tecnologia. A experiência não é apenas sobre IA, mas sobre o que significa ser humano em tempos de vozes sintéticas e identidades replicáveis.
Vocalize convida os participantes a se ouvirem com novos ouvidos — literalmente — e a repensarem o poder, a propriedade e a emoção contida na voz.
O futuro da voz na era da IA
Com a popularização de clones vocais e assistentes sintéticos, o debate sobre regulação, consentimento e uso ético será cada vez mais necessário. É provável que vejamos, nos próximos anos:
- Legislações específicas para clonagem vocal
- Certificações de autenticidade de conteúdo sonoro
- IA’s com assinatura vocal personalizada
- Crescimento do mercado de vozes licenciadas como ativos digitais
Conclusão: mais do que uma voz, um chamado à consciência
A instalação Vocalize, ao utilizar a voz de Stephen Fry gerada por IA, é mais do que um espetáculo técnico. É um convite à introspecção: Como proteger nossa identidade vocal em um mundo onde qualquer som pode ser reproduzido?
Com criatividade e crítica, o Hay Festival mostra que a arte e a tecnologia podem — e devem — caminhar juntas para inspirar uma sociedade mais consciente e ética.